Como estão vocês, 99 assinantes? Sim! Isso mesmo. Falta apenas uma alma caridosa para nos tornarmos 100 ledores dessa newsletter e seguir compartilhando nossas paixões insaciáveis, dores de um dia e gozos de um instante. Quem será que será?
Para celebrar essa semana solar, vamos jogar uma luz de volta em alguns clássicos da comédia mundial. Fontes, nascentes, mananciais, a cabeceira, onde, arqueados e com as mãos em concha, podemos matar a sede de risos, kkkks e rsrs para não sucumbir nas trevas em que os novos oligarcas insistem em nos embromar.
Nessa edição, você rirá dos 50 anos de Saturday Night Live, com a resenha da série SNL 50 – Beyond Saturday Night e do livro Live From New York, sobre as muitas histórias do programa. Você gargalhará ao saber o que os humoristas portugueses tem a dizer sobre a comédia no livro Com O Humor Não Se Brinca, de Nelson Nunes. Você também se regozijará com a vida e obra do pré-tuiteiro, Don Rossé Cavaca.
Outras Considerações hoje é só alegria! Enjoy, my boy.
1 - Live From New York
Já dizia o poeta: “Todo mundo espera alguma coisa de um sábado à noite”. Em 1975, o jovem canadense Lorne Michaels e um grupo de escritores egressos da National Lampoon’s pegaram a visão e, a partir de um formato antigo e consagrado na TV - mistura de esquetes de comédia com números musicais - criaram um programa inovador e rebolucionário, o Saturday Night Live.
Lembro de um dos primeiros esquetes que vi do SNL foi uma paródia de talk show intitulada “James Brown’s Celebrity Hot Tub Party”, com Eddie Murphy - na época, o ser humano mais engraçado do mundo - de roupão, imitando perfeitamente os trejeitos e a voz de James Brown, ele tentava entrar em uma banheira de água quente no meio do palco, enquanto a banda tocava um funkão estilo “Cold Sweat”, Eddie encostava a ponta do pé na água e dava um daqueles gritos característicos de James. Muito ídolo.
Não era possível, naquela época, “maratonar” e assistir temporadas inteiras. Como já sabemos, o barato era esperar o episódio da semana seguinte enquanto circulava o bordão hilário criado por Chevy Chase abrindo o quadro Weekend Update:
“Olá, boa noite, eu sou Chevy Chase. E você não é.”
Entre outros personagens e bordões memoráveis, a contribuição do SNL para o que, um dia, já foi a indústria do entretenimento é monumental. Vai dos gênios da comédia como John Belushi, Dan Akroyd, Gilda Radner, Bill Murray, Jon Lovitz, Will Ferrel, Amy Poehler, Tina Fey (primeira mulher na redação final do programa), Maya Rudolf, Jimmy Fallon, Bill Hader, Phil Hartman, Billy Cristal, Steve Martin, Chris Rock, Eddie Murphy, Dana Carvey, Mike Meyers, Fred Armisen (já falei? Não) isso só pra citar de cabeça. A lista é interminável.
Sem falar nas participações especiais de convidados que apresentam e participam do programa se auto-zoando e nos inúmeros musicais de bandas e artistas tocando ao vivo. SNL é praticamente um sonho construído a base de cocaína e competição feroz entre os roteiristas e quando todo mundo acha que vai acabar, o programa se renova.
Uma série documental em quatro partes foi lançada em janeiro desse ano: SNL 50 – Beyond Saturday Night. Cada episódio foca em aspectos distintos que contribuíram para o legado do programa ao longo de suas cinco décadas no ar:
Five Minutes - Um episódio sobre as audições dos comediantes e a pressão para se conseguir uma vaga no elenco.
Written By: A Week Inside the SNL Writers Room – Uma imersão na sala dos roteiristas e a dinâmica colaborativa na pressão dos esquetes semanais.
More Cowbell – Um episódio inteiro dedicado ao icônico esquete “More Cowbell” onde uma ideia simples se torna um fenômeno cultural.
Season 11: The Weird Year – Sobre a temporada mais conturbada (1985-1986) e marcada pelo retorno se Lorne Michaels ao programa.
Infelizmente, a série não está em nenhuma plataforma de streaming. Mas, como é bem sabido, com o contato certo e alguns cliques é possível encontrar por aí.
Empolguei aqui falando da série, mas a resenha seria mais sobre o livro intitulado Live From New York: The complete, uncensored history of Saturday Night Live as told by its stars, writers and guests. O nome é enorme e minha edição é a comemorativa dos 40 anos de SNL, porém, muita coisa se aproveitou para a série e um filme que ainda não vi, mas fontes me disseram que é meio mais ou menos.
2 - Com o Humor Não Se Brinca
Saindo dos Estados Unidos e voltando os olhos para nossa outra matriz, o livro Com o Humor Não se Brinca, de Nelson Nunes, traz uma série de entrevistas com os comediantes portugueses: Herman José, Bruno Nogueira, Nuno Markl, Ricardo Araújo Pereira, entre muitos outros.
Cheio de histórias pessoais sobre carreira, caminhos da comédia, técnicas, ferramentas e problemáticas da piada. Percebemos que, em termos de humor, temos várias questões em comum com nossos primeiros colonizadores.
Há limites para o humor? Piadas só funcionam se tiver um alvo? Por que existem tão poucas mulheres humoristas? Como se deve fazer uma piada? Todo humorista é egocêntrico? Perguntas sobre a arte de fazer rir que atravessam gerações.
Ricardo Araújo Pereira, fundador do grupo Gato Fedorento, revela que seu espírito humorístico nasceu por causa da vó extremamente mal-humorada. Seu objetivo era fazê-la rir. Segundo ele, era uma viúva austera que “levava a circunspecção muito à sério”. Sempre de “cenho franzido” e qualquer riso que ele conseguiu arrancar da vozinha, ouvia logo em seguida a frase: “não tens graça nenhuma”.
Em uma outra entrevista, o comediante Salvador Martinha argumenta que “a boa piada sempre parte da surpresa”, o que me traz de volta ao Brasil e me faz pensar no axioma inviolável do diretor Maurício Sherman (1931-2019) quando analisava os roteiros da equipe: “Quando você vai escrever um bom esquete de humor, ou você já tem o final da piada ou...você é um merda.” Show must go on.
3 - Um Riso Em Decúbito
A saudosa Editora Desiderata lançou, lá pelos idos de 2007, a coleção Sigmund com os livros de humor: Como Casar Com Um Rapaz Solteiro de João Bethencourt, Existe Sexo Após a Morte? de Adão Iturrusgarai, Gente Fina de Bruno Drummond e Um Riso em Decúbito da lenda Don Rossé Cavaca.
O jornalista, publicitário, radialista, ator, produtor e humorista José Martins de Araújo Jr. dizem que inventou a “pegadinha” e adotou a alcunha de Don Rossé Cavaca para assinar uma coluna de humor do jornal Tribuna da Imprensa. Perdemos esse grande frasista em 1965, em um acidente, quando saía da redação do jornal.
Na primeira edição, o livro custou 995 Cruzeiros e dentro do volume, foi incluída uma nota de 5 Cruzeiros para tornar Um Riso Em Decúbito, o “primeiro livro do mundo que já vem com troco”.
Alguns exemplos da verve Cavaquiana:
Uma boa piada, pena que foi de propósito.
É tanta polícia que a gente fica sem a mínima garantia.
Flagrei minha mulher me pegando em flagrante.
Acredito na sua honestidade, mas a quadrilha já está formada.
É a quinta massa fria vinda do Sul que o Rio desmoraliza.
Tem cura, doutor? Se tem, vamos desenterrá-lo.
Humoristas agora lutam por um mundo menos engraçado.
Bons tempos aquele! Como se ganhava pouco!